Hoje ao olhar-me no espelho , vim um rosto pesado e triste , que me levou de emediato a levar as mãos cheias de aguas e descarregala sobre as faces e sentir o refrescante penetrar-me a pele.
Voltei fixar o espelho e senti-me mais confortante , mas mesmo assim o semblante continuava carregado.
Tentei disfarçar com um pouco de creme e umas pinturisses, dei uma escovadela no cabelo, mas voltei a desgadilha-lo. nunca gostei de cabelos muito penteados e dirigi-me até a janela onde os carros passam e quase não se vê ninguêm
Fixei os olhos na distancia em busca do lugar das minhas fantasias, mas não o encontrei, pois perdi-me na realidade que está sendo brusca e dolorosa, nesta etapa da vida deixando-nos com o chão a mover-se debaixo dos pés fazendo-nos ir buscar forças sobrenaturais através da fé.
Lutar contra a maré , contra a corrente tenebrosa dum rio com levadas medonhas, lutar , lutar pela minha felicidade recordando aquele lindo arco ires com que Deus me presentiou.
Fiquei ali sentada na cadeira mesmo junto a janela com o olhar perdido na estrada vendo os carros passar.
Sonhei com o mar
Depois de ausente tanto tempo, hoje, aproximei-me da minha janela e de olhos fechados imaginei-me longe.
O dia acordava fresco e orvalhado.
O dia acordava fresco e orvalhado.
Quis sentir os meus cabelos alvoraçados pela marzia e o sussurrar do vento deixando a minha face molhada com beijos a saber a mar, quis ouvir o ribombar das ondas estremecendo o meu peito e a minha imaginação.
Mas abri os olhos e da janela e apenas vi uma rua vazia onde não passa ninguém e os carros que circulam nela, vão com pressa para chegar a algum lado.que quase não distingue a marca e a cor. Volto a fechar a janela e o silêncio prolonga-se mais denso e forte, enchendo-me de vontade de ouvir o mar , fecho os olhos e deixo-me levar pela imaginação longe, até onde os salpicos de espuma se desfaz no ar.
PASSOU O TEMPO
Encostada a minha janela deixo-me envolver pela nostalgia de
algum momento esquecido dentro de mim, enquanto oiço o fado na voz dalguém que
canta o amor e a tristeza com mãos cheias de nada.
Espreito ao longe essa encruzilhada de caminhos, onde os
passos se arrastão nas decisões tomadas pela solidão, e na tristeza dum coração
vazio transformando vidas em momentos tristes e sombrios.
Passou o tempo e eu ali parada de olhos pregados na rua mal
iluminada onde não passa ninguém, apenas o meu pensamento a percorrer as pedras
da calçada, pisando um asfalto de silêncio num caminho sem sombras.
Como o tempo passa nesta calmaria de horas tão cheias hoje
de mim.
Olhei para o meu rosto espelhado na janela e sorri, apesar
dos anos achei-me bonita, com meus cabelos brancos a serpentarem a cabeça e
apesar das rugas as minhas mãos não estão mais cheias de nada, porque
transbordam de afetos sinceros, verdadeiros, autênticos e puros.
Hoje posso sonhar, pedir sem implorar, posso rir e
gargalhar, sem precisar fantasiar a vida fingindo ser feliz.
A minha história de amor
Conheci o meu marido numa igreja evangélica, frequentada também
por uma amiga comum, que já me tinha dado informações desse amigo,
despertando-me alguma curiosidade, mas eu ainda lambia as feriadas deixadas por
um casamento de maus tratos psicológicos, frustrações e duma profunda
desilusão.
Eu não me sentia preparada para nada. Sem auto estima e amor-próprio,
vivia o dia-a-dia como robô, as voltas com uma terrível depressão que um dia
disparou o gatilho, adoecendo-me o corpo num cansaço doloroso em que me foi
diagnosticado fibromialgia.
Esvaziada de tudo o que fazia parte da minha história de
vida, fui em busca do trilho que atrás de mim, quase se tinha apagado. Aceitei
fazer voluntariado na Guiné Bissau na Instituição Casa Emanuel através da ONGd
Coração na Guiné, para onde o equipamento da Maternidade Mariana Martins de
Elvas tinha sido doado, após o seu encerramento pelo Estado Português.
Talvez fosse o meu ultimo projecto ou a única coisa boa que
faria, já que tudo o resto não tinha sido um mão cheia de nada.
E fui por duas vezes para a Guiné , onde trabalhei e dei
formação, entreguei-me de corpo e alma a tudo o fazia para não pensar. A sala
de partos era o meu opio e os partos davam luz à vida que me tinha sido
apagada.
Quando regressei da ultima vez , tive a triste noticia, a
nossa amiga comum tinha nos deixado e isso de certa forma nos aproximou , pois
começamos a conversar, a conhecermo-nos e pouco a pouco fui-me afeiçoando a sua pessoa
, pela forma de escrever e depois de falar, chegando a sentir falta do som da
sua voz.
Entretanto por causa dum familiar seu, que precisou de ser consultado no hospital e
que ele acompanhava cada vez que vinham a consulta , encontrávamos e
tomava-mos café juntos, no bar do hospital.
Mas eu não queria uma aventura, nem um namorado colorido,
dizia eu cada vez que o diálogo se tornava mais íntimo eu fugia do assunto.
Eu trabalhava no 3º piso do Hospital Santa Luzia de Elvas e
ele sempre me acompanhava ao meu local de trabalho depois de tomar o café.
Mas naquele dia foi diferente.
Mas naquele dia foi diferente.
A porta do elevador fechou-se atrás de nós, íamos sozinhos e num instante eu fui roubada dum beijo, e foi o mais lindo que alguma vez recebi.
Caíram todas as barreiras, até o projecto de voltar à
Guiné e ficar lá para sempre doando o que restava, como quem põe um
ponto final no que sobrava de mim.
Mas Deus apagou o ponto final que eu tinha colocado e substituiu por uma virgula para eu reescrever a minha história colocando
os personagens certos na minha vida
Casei no Cartório do Crato no dia 2 de Março de 2018
A partir daí a vida voltou a sorrir, o medo dissipasse e agora
sou uma mulher feliz, apesar de me ter casado aos 61 anos, com António João
Matutino Paixão de 62 anos.
Nunca é tarde para amar
Rosa Maria Bernardes Abrunheiro Matutino Paixão
Fim de semana
Adormeci ao som da
badaladas do relógio da torre da igreja já tarde da noite, mas com o coração
cheio de alegria depois dum fim de semana caseio e de casa cheia.
A salamandra ao
rubro emanava calor enquanto a lenha desaparecia na canastra para se voltar a
encher novamente.
O meu sobrinho
constipado quase não se levantou da cama , mas isso não atrapalhou o convívio
desses dois dias maravilhosos. A cris , sua mulher e o filho Rafa, foram
maravilhosos , com a alegria e a boa disposição que trouxeram na bagagem dum coração generoso.
Sou grata a Deus por
esses momentos em que pude visitar o passado através de memórias vividas da nossa infância e
também recordar aquela que foi para nós muito muito importante a mãe do João ,
meu sobrinho, ao qual eu também chamava de mesinha.
As horas passaram
tão rápidas que de repente já tudo tinha acabado e eu ainda ouvia as badaladas
do relógio da torre da igreja da aldeia .
O meu marido foi
um companheiro e tão atento a todo entusiasmo desse dia, adormeceu tão tranquilo
e feliz com a minha felicidade que me senti tão grata a Deus por esse maravilhoso
fim-de-semana.
De certeza que o
relógio tocou, mas já não ouvia as badaladas.
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